GUIA DE LEITURA

Se você me perguntasse quais textos ler, eu diria para CLICAR AQUI e achar uns 20 e poucos que eu classifiquei como os melhores. Mas vão alguns de que eu particularmente gosto (e que fizeram algum sucesso):

Caritas et scientia
(as saudades da minha escola)
A-Ventura de Novembro
(o retrato de um coração partido)
Vigília
(os sonhos nos enganam...)
Sairei para a boate e encontrarei o amor da minha vida
(ou "elucubrações esperançosas")
(a afeição por desconhecidos)
A tentação de Mãe Valéria
(trago a pessoa amada em três dias)
A nostalgia do que não tive
(a nostalgia do que não tive)

quarta-feira, 31 de dezembro de 2008

a moda engajada do próximo reveillon (2ª tiragem)


republicando,  no momento adequado (o texto é de 22 de fevereiro do ano que hoje termina)

lançarei moda:
ano que vem, passem o ano novo de laranja.
façam uma homenagem a quem desfaz o que fazem no ano novo.
façam uma homenagem a quem cata as garrafas caídas e as garrafas arremessadas.
façam uma homenagem a quem limpa os caroços das uvas e os bagaços de um ano velho.
façam uma homenagem a quem recolhe todos os cigarros e as cervejas da ebriedade alheia.
façam uma homenagem a quem não estoura o champanha, mas cata a rolha.

ano que vem, passem o ano novo de laranja.
pode não ser a cor da paz, mas é a cor da limpeza, mais do que o branco.
e sem superstições.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

eu, a chave, a velhinha, o medo e, quase, a generosidade.

Aconteceu há mais de seis meses, mas só hoje resolvi contar.

Estava caminhando na capital francesa como aqueles turistas que não querem nada. O dia estava um pouco nublado e eu já estava voltando para o hotel depois de bater pernas por muitas horas.

Entrei numa transversal de uma importante avenida e rumava em direção a uma das estações de metrô. Várias pessoas passeavam também, inclusive um casal de turistas brasileiros que não sei lá como me reconheceu enquanto conterrâneo e pediu em português para eu bater uma foto deles diante de uma casa que nada tinha de demais. Bati a foto e segui.

Dei alguns passos a frente e uma velhinha me abordou. Uma velhinha lá nos seus 70 anos, que falava um francês meio estranho, muito apressado, atropelando palavra. Parecia não ser francesa. Não estava muito bem vestida, tinha alguns dentes pretos, o nariz estranho, o cabelo mal-cuidado, algumas rugas e trajava um vestido preto nada elegante. Muitas rugas e a expressão desesperada. E por mais assustadora, até repugnante, que possa parecer essa velhinha, ainda era uma velhinha daquelas que inspira uma atenção especial. Não sei direito porque, mas tenho uma adoração especial por pessoas idosas, sendo os seres com os quais eu mais me sensibilizo.

Fato é que a velhinha estava com umas chaves na mão e em seu linguajar meio ininteligível, ou no mal-entendimento de meu parco francês, me disse que a chave ou a fechadura estava com problemas e me pediu ajuda para abrir a porta de onde morava. Não compreendi exatamente do que se tratava. Concordei com a cabeça e fui seguindo a mulher.

Entramos no quarteirão, pois seu prédio era daqueles cuja portaria não fica na rua, mas no interior do quarteirão, como alguns prédios do centro do Rio. O lugar estava vazio e não falamos nada até chegarmos ao portão principal. Já fui meio receoso sobre o que se seguiria, mas não quis pensar muito.

Chegando ao portão, pedi a chave para tentar abri-lo. Ela olhou educadamente e disse que a fechadura da portaria estava abrindo, mas que era para eu subir e tentar abrir a do apartamento dela. Pegou a chave e abriu o portão da portaria, dando um passo a frente e sinalizou para que eu também entrasse.

Não entrei. Travei no capacho e fiquei olhando para a cara dela, sem saber o que falar. Não iria subir aquele prédio vazio, num lugar em que eu não conhecia, com uma senhora que não havia me passado a melhor das impressões e estando eu sozinho na cidade . Fiquei com medo de que tudo aquilo fosse um golpe e ali minha viagem fosse para o beleléu. Imagina...

Falei a ela que não poderia subir, mas não quis explicar. Ela ficou desolada e perguntou o porquê de minha recusa, esboçando uma cara ainda mais desesperada. Comecei a suar frio tamanho era o conflito na minha cabeça: e se eu estivesse tratando como suspeita ou farsária uma velhinha necessitada e tão motivadora de compaixão? Ia deixá-la ali na rua implorando pela ajuda alheia para que ela conseguisse entrar em casa?

Ela me sensibilizou, mas meu lado racional e cunamãocional falaram mais alto. A história da chave não era lá muito plausível e o pedido de ajuda logo a mim, que não tenho cara nem know-how de chaveiro, não era muito razoável. E ainda lembrei de minha mãe, na minha distante infância, dizendo para eu não dar papo a estranhos. Por fim, preferi achar que era tudo um golpe e que o risco não compensaria a generosidade. 

Reiterei meu não e virei as costas dizendo a frase mais mãos-vazias da língua dos biquinhos e mil acentos: "desolé". Andei de volta para a rua. A velhinha ficou implorando para eu voltar, pedindo ajuda. Eu relutava em não olhar para trás, pois sabia que sua carinha enternecedora poderia me fazer voltar atrás na decisão de ignorar. Ela continuou a falar e eu seguia com o passo, embargado, tanto quanto sua voz, que ia sumindo como se ela tivesse resignado e fosse sentar e chorar.

Se sua voz sumiu em meus ouvidos, ainda continuou por um tempo a ecoar em minha cabeça. Até hoje, não sei direito se acertei ou errei em minha precaução ou em meu preconceito. Não quis pagar para ver, mas também esqueci que a dúvida impõe um preço um tanto salgado, parcelável em tantas vezes quanto for lembrada história. Compartilho a fatura.

domingo, 21 de dezembro de 2008

VOLTEI.

Há quase dois meses não publico, à exceção de uma passagem justificando a ausência de um mês, que melhor e de forma mais bela se explica pela seguinte passagem, do texto que me consumiu as últimas duas semanas e que definitivamente não se encaixa no propósito desse blog (ou pelo menos se insere no que eu não quero para o blog) e portanto não será publicado (publicado em agosto de 2010):
"... tudo indicava o caminho de uma crescente entorpecedora, capaz de distrair, capaz de, por conta da dedicação exclusiva, fulminar o olhar atento de quem cria, como se a função poética tivesse sido emprestada a mais nobre serventia e em seu lugar entrasse, como mero tapa-buraco, a infrutífera e egoísta função metalinguística."
Entenda o tudo como o que hoje é nada.
Mas não importa: estou de volta.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

e então...

Não escrevo há quase um mês. Mesmo. Nem tentei escrever alguma coisa. Nada.
Blog e distração não combinam. Passo pela rua tão avoado que o metrô e as pessoas, o "onde" e o "o quê" das minhas inspirações, nada têm para mim de novo.
Tudo me é tão contingente, e eu, pudera, sou tão normal a mim mesmo que mal me percebo.
O blog tão vazio e eu tão carregado (ou tão leve). Carregado do indizível, ou talvez do impublicável. Longe do racionalizado. Cheio do intuível, do quase secreto e do preservado.
Distraído, quiçá blindado. E dentro de um cubo de espelhos, nada me resta no segundo. Então eu apelo à metalinguagem.
Logo voltarei.

terça-feira, 28 de outubro de 2008

O CÚMULO DA CARA DE PAU.

Já era tarde e eu estava no metrô voltando da faculdade para casa. O vagão estava um tanto cheio, mas havia ainda dois lugares disponíveis. Um deles era ao meu lado e o outro era à minha frente.

Entrou um cidadão no trem e se dirigiu ao lugar à minha frente. Acontece que esse lugar estava "ocupado" por um caderno do Iron Maiden de uma pessoa que ao lado ouvia música. Educadamente, o senhor que entrara apontou para o caderno, sinalizando que queria se sentar ali. O dono do caderno, meio contrariado, apontou para o outro lugar vago, sem tirar o fone de ouvido.

O cidadão que queria se sentar apontou mais uma vez sacudindo a mão, já um pouco impaciente. O dono do caderno resolveu falar, com cara de "deixa de ser chato" : - senta ali, cara.

O homem desejoso do assento, já estarrecido com a situação, aproximou sua cabeça à do dono do caderno e, em tom amaeaçador, falou algo como: - quero sentar aqui, meu camarada, entendeu?

Achei que os dois fossem acabar nas vias de fato, mas o rapaz do caderno ficou intimidado e, com cara de de "whatever... i'm a bitch", pôs o caderno no seu colo para dar o lugar. O cidadão que queria se sentar finalmente se sentou. Como ele era meio largo (e lá poderia eu falar de um "mundo e os gordinhos 2") e não cabia direito no banco, acabou ficando encostadinho ao ser cínico a que há pouco se opusera. O clima ficou tenso.

Na estação seguinte, desceram várias pessoas e o moço que antes queria se sentar acabou indo para outro lugar no vagão. Imediatamente, o caderno voltou ao seu lugar especial, como se ali fosse um trono, um camarote especial, uma área VIP ou coisa que o valha para aquele amontado de papel com o quase-amedrontador Eddie na capa.

Logo em seguida, entraram mais pessoas no vagão. Duas senhoras resolveram se sentar e, para uma delas, só sobrou o lugar que então acomodava novamente o caderno. Pensei que a via crucis mais ridícula de minha vida "disputar um lugar com um caderno" fosse ali recomeçar. A senhora com várias sacolas olhou para o homem e apontou para o caderno. O dono do caderno dessa vez olhou para ela, resmungou qualquer coisa e pôs o caderno de volta no colo. Estava com cara de decepcionado, desolado e decepcionado.

Que preguiça tola, porca e nojenta é essa de não querer ficar com o caderno no colo, na mochila, na cabeça ou no... ah, deixa pra lá.

quinta-feira, 23 de outubro de 2008

A ÚLTIMA SEGUNDA DA QUINTA.

Na segunda, ela foi a quinta no ano.
Não era um pássaro, não era na construção.
Nem na Construção de Chico.
Não era de mentira, nem era abstração.

Na segunda, ela subiu do térreo. Até o quinto?
Desceu. Mas não foi até o quinto dos infernos.
Que a Quinta lá fosse próxima...
Mas ela pousou sobre um jardim qualquer.

Na segunda, em um segundo, a notícia se espalhou.
E logo os terceiros vieram ver o que acontera.
E assim ela foi a primeira às atenções,
o que nem pôde perceber, pois já passara das últimas.

Na segunda, todos foram às rampas e passarelas.
Viram o manto branco que sobre ela se fez sudário.
Viveram o baixo astral que sepultou o frenesi universitário.
Ouviram mil coisas a respeito, supuseram outras mil tão sem respeito.

Naquela segunda, os sinos não badalaram.
Mais alto gritaram as sirenes.
E mais forte giraram suas luzes,
em vermelho hemorrágico e aterrorizante.

Na segunda, uma cama dormiu vazia,
pois alguém escolheu dormir para sempre,
e escorregou, escorregou?, para a vida eterna.
Deslizando suave para não se sabe lá onde.

Foi sua última segunda.
Venceu a barreira que separa o aqui do acolá,
mas isolou-se pelo cordão de isolamento amarelo e preto,
que só os olhos ousaram atravessar.

Ninguém queria acreditar que, quando a tarde estava para cair, alguém preferiu se jogar.

Ninguém queria acreditar.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

fossa dominical

domingo é um dia perigoso.
não é à toa que no calendário ele vem marcado em vermelho.
é quase como se a folhinha dissesse: perigo!

domingo é aquele dia que você acorda tarde e cansado.
é o dia para pagar a conta do sábado.

no domingo, você já acorda para o almoço.
se fizer sol, pode até rolar uma praia.
mas se fizer chuva... é aquela preguiça.

ficar em casa no domingo é realmente complicado.
talvez seja gostoso pegar um livro e observar a chuva caindo em preto-e-branco.

computador e domingo são mistura letal: não só o domingo é perigoso.
MSN, orkut, joguinhos quaisquer... ultra-tedioso.

televisão e domingo parecem tanto combinar...
faustão, gugu, sílvio santos, fantástico....
e agora nem tem mais o topa tudo por dinheiro.

domingo para muitos é o dia do futebol.
de se preparar para zoar ou ser zoado pela semana em razão do seu time.

domingo é o dia daquela fina melancolia que pode se avolumar em depressão.
e domingo é a véspera da segunda, que já fica decretada desde a hora em que termina o fantástico.

domingo é o dia do descanso. domingo dormindo.
mas domingo também é o dia certo da insônia.

domingo é o dia de ir a missa.
a quem se importar.

domingo é o dia que começa tarde e acaba cedo.
é de forma alguma dia útil.

domingo é a fossa. quase séptica.
você fica pra baixo e se encontra na merda.

os domingos deveriam estar mais bem sinalizados.
estar em vermelho não basta. precisam estar em baixo-relevo.
e quase furando o papel.

sábado, 11 de outubro de 2008

maindaguép

O metrô perdeu muito de sua graça desde que eu comecei a usá-lo todo dia para voltar para casa da faculdade. O que antes para mim era um lugar para os achados caricatos e quase-literários que muitas vezes já trouxe aqui, atualmente são os quarenta ou mais minutos de suplício diário.

Se antes eu era capaz de me negar a pegar um livro, o MP3 ou o celular para jogar o tétrico Tetris, apenas para ficar observando as coisas que aconteciam no metrô, hoje não tem mais como. Entro no vagão e já penso no que eu usarei para me distrair. Se consigo sentar, leio alguma coisa. Se tenho o MP3, vou ouvir música. Mas se nada me restou além do celular, eu vou direto para o Tetris. Tenho quebrado o meu recorde a cada dia. Tetris vicia e dá insônia: na hora de dormir, até imagino os bloquinhos encaixando. É enlouquecedor.

Mas voltando ao metrô, essa semana ele me surpreendeu. Já estava eu absorto em meus tediosos pensamentos e passa-tempos, quando a tão fastidiosa gravação "Próxima estação: Estácio, Next Stop: Estácio Station" foi seguida por um MIND THE GAP, cuja mensagem corresponde ao tradicional "observe atentamente o espaço entre o trem e a plataforma".

Minha cabeça deu uma volta ao mundo. Consegui ser transportado ao tube londrino, com seus vagões apertadinhos, seu cheiro não muito agradável e o sotaque irritante do "PLEASE MIND THE GAP BETWEEN THE TRAIN AND THE STATION." E para falar dos souvenires mil que se vendem pela cidade com o tão falado MIND THE GAP? Tinha até uns trazendo piadinha sexual com esses dizeres.

O MIND THE GAP em sotaque tupiniquim é no mínimo estranho. É falado super rápido e quem não entende inglês vai achar que é um erro de gravação, um barulho do metrô, ou qualquer coisa que o valha. Quem entende inglês e sabe do que se trata, vai viajar internacionalmente na maionese. Em pleno Metrô do Rio, que não mais atende confortavelmente a sua demanda, que cresce a passos de tartaruga numa cidade hipertrofiada, que em certas horas vira a mais nojenta e popularmente agressiva lata de sardinha, o cidadão será remetido ao bom transporte público das metrópoles desenvolvidas.

Mas tudo bem, vou poupar minha acidez.... não é só no metrô londrino que há vãos entre os trens e a plataforma. E tombo é tombo, em qualquer lugar do mundo.

quarta-feira, 8 de outubro de 2008

o antes.

ele estava decidido que ia pegar o telefone e ligar.
já conseguira o número com uma amiga.
já conseguira coragem com um amigo.
e já conseguira conseguir consigo mesmo.

tanto lera o número no papel
que já o sabia de cabeça.
e já quase estava com dor de cabeça.

ia ligar, mas não sabia o que falar.
convidá-la para ir ao cinema...
ver o último filme do woody allen?
quem sabe o teatro?
até estava com a filipeta de desconto!

podia chamá-la para ir a praia...
mas e se ela estivesse numa "má fase"?
então pensou num flash...
e se ela estiver de TPM?
receberá um fora de uma fera?

domado pela própria dúvida,
resolveu apostar na própria intuição.
as palavras na hora viriam
e tudo seria lindo, como acontecem nos filmes.

ele estava mesmo decidido que ia pegar o telefone e ligar.
e se o telefone dela estivesse desligado?
e se o número fosse errado e desse engano?
toda aquela angústia para nada...

pensou e pensou.
ligou a TV para dar uma relaxada, mas a coisa estava difícil.
foi à geladeira beliscar qualquer coisa.
brincou com a cachorrinha que queria qualquer atenção...
ela tão esperta que já até sentia uma pontinha de ciúmes.

enfim, pegou o telefone na mão.
discou o número, algarismo por algarismo.
dois. cinco. três. quatro. quatro. três. três....
ai caramba, o último número era um quatro ou um nove?

fez unidunitê... deu nove.
apertou o botão que faltava...







e ligou.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

"brincadeira de criança... como é bom..."

PASSA SE NÃO FEDE, SE PASSAR FEDEU.
Estava esses dias visitando o colégio por onde passei onze felizes anos de minha vida e de onde tenho muitas das minhas melhores recordações. Passando pela escada, me lembrei de uma brincadeira das várias que aconteciam quando eu era criança.

Sempre que subíamos a escada lá pela segunda série primária, algum engraçadinho dava um tapinha no outro e falava "Passa se não fede, se passar fedeu". Era uma vergonha imensa você ser pego por essa brincadeira, porque ficavam contando regressivamente para você passar a tal "coisa" para alguém, ou federia. Que "coisa" era essa que se passava eu até hoje não sei, mas a brincadeira se alastrava como um vírus da gripe aspergido num elevador lotado.
Desenvolviam-se formas de não poder receber, uma delas era o cadeado. Você fechava os polegares com indicadores e ficava assim como se dissesse: "ha, não serei eu!" Mas tinha que ficar sinalizando o tempo todo, e era um saco ficar com a mão em posição de cadeado, então alguns engraçadinhos inventaram a idéia de engolir o "cadeado". A questão é que a pessoa engolia o cadeado e isso não ficava visível, logo todos fingiam que tinham engolido o cadeado quando alguém tentava "passar". Outra coisa que usavam era o "espelhinho", isto é, a mão virada em sinal para parar, como forma de devolver o que era passado.
A escada inteira ficava atenta para a brincadeira, pois ninguém queria "feder". Epidêmico.

PIQUE-QUALQUER COISA
Haja pique para tanta brincadeira. Lembro que era de lei sair da aula da tarde e ir para o pátio brincar de pique esconde ou polícia-e-ladrão. Tenho excelentes recordações desse tempo, exceto pela minha baixa habilidade em correr. Nunca foi meu forte, mesmo. Mas sempre fui bom estrategista, por isso odiava pique-pega. Não havia brincadeira mais idiota do que pique-pega, afinal, em que momento eu pensava ali?
Veio-me à cabeça agora o momento de tirar os times ou dividir as equipes. Havia vários métodos. Um deles era o par ou ímpar para saber quem seriam os cabeças, e dali escolhiam-se os participantes. Outro método era fazer uma fila em que se escolhiam as pessoas, não sei direto como era, mas todo mundo tentava burlar essa fila dizendo que era "ZERINHO", "FOLHINHA DE ABACATE, NINGUÉM ME RECOMBATE" (temo que minha memória esteja falha) ou "FILHINHO DE DEUS". Nossa mãe, ultra-apelativos esses bordões.

DESPOTISMO NO FUTEBOL
Minhas recordações do futebol infantil me remetem à porradaria, mandos e desmandos. Acho que o fato mais emblemático era o de um colega que simplesmente era o "dono da bola" no jardim de infância. Aliás, sem forçação de barra, acho que pensar, pensericar, sobre isso naquela época foi o primeiro e mais ultra-incipiente estalo na minha vida para o interesse pela política, pela diplomacia interna, pela organização da força, pela tal da natureza humana, se é que existe, pela formação do Estado e pela necessidade do Direito.
O futebol dependia dele, por mais que a bola e o campinho não lhe pertencessem. Ele era simultaneamente jogador e árbitro da partida. Ele mudava de time à hora que quisesse e ainda levava os gols que marcara ao longo de toda a partida para o time em que viesse a entrar. Isso queria dizer que, ao seu belprazer, havia vitória de um ou de outro lado. Ninguém nunca se rebelou contra a situação e todos se curvavam àquela estrutura tirânica e viciada. Arrisco-me a dizer que fariam o mesmo se tivessem a chance de estar na posição de dono da bola.
Daria uma tese de doutorado a análise daquela situação, e não raramente ela me vem à cabeça como um nanocosmo de sociedade, poder e Estado que, por ter vivido e sentido, pode me servir bem e à escala cabível como metáfora para algumas coisas que me cercam hoje.


CHARADINHAS INGRATAS.
Tem sempre alguém que ouve de irmão ou primo mais velho que o galo cantou para a galinha em Porciúncula e resolve trazer a novidade para a pirralhada.
Por volta da terceira série, lembro que um colega chegou para mim e perguntou se eu preferia dar ou receber. Acho que nem eu nem ele entendíamos bem do que se tratava a brincadeira, mas havia um temor absurdo em falar algo e ser muito zoado. Não me lembro do que respondi.
Em outra ocasião, a piadinha era a da galinha que botou na cueca três ovos e chocou um, do qual nasceu um pinto.
Entretanto, a melhor das charadinhas infantis aconteceu no terceiro ano do ensino médio. Isso mesmo, no ano passado. Não siga adiante, caso você não goste de piadinhas baixas. Ela consiste em perguntar para o próximo: "O que toma de café-da-manhã um indivíduo com um pênis grande? Você sabe?" Muitos ingenuamente respondem: "Não sei, o quê?"
E aí vem a resposta fatídica: "É foda ter pau pequeno, né..."

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

O TAXISTA QUE NÃO DEU PAPO

Li certa vez, se não me engano foi no blog do Bruno Medina, tecladista do Los Hermanos, que papo de taxista é o último aliado daquele que escreve crônicas. Tudo bem que os tímidos ou reservados dificilmente terão a chance de perceber que uma corrida no táxi significa muito mais do que se deslocar com grande custo de um lugar para outro, mas aqueles que gostam de puxar um papo certamente sabem o quanto os taxistas tem muito a acrescentar. (Vale dizer, tem até o blog de um taxista gaúcho , o Taxitramas. Leitura extremamente recomendada!)

Especialmente no Rio de Janeiro, onde a simpatia, a cordialidade e a "intimidade com estranhos" (aliás, título bem interessante do novo álbum do Frejat) são valores sempre em voga, é quase certo que alguma inserção pequena de assunto descortinará uma longa conversa. E os taxistas, como trabalhadores que passam grande parte do dia num carro celebrando a aleatoriedade da companhia, com várias pessoas "nunca antes vistas" (pareceu discurso do Lula) entrando e saindo de seus carros, sempre acabam tendo algo interessante para repassar do que ouvem ou do que vêem.

Assim que entro num táxi, trato de puxar assunto, principalmente quando estou sozinho. Não entra na minha cabeça a possibilidade de ficar vinte minutos dentro do carro com alguém sem trocar uma palavra que não a informação da rua para onde estou indo. Já chego perguntando há quanto tempo a pessoa trabalha em táxi, se gosta, o que fazia antes, se já foi assaltado, que coisas engraçadas já aconteceram e etc. O taxista geralmente se sente super prestigiado, afinal, tem alguém interessado em saber o que ele tem a dizer, e talvez seja naquela hora que ele entenda porque não preferiu ser maquinista de trem ou motorista de ônibus. No táxi, não tem o aviso ingrato de "SÓ FALE AO MOTORISTA O INDISPENSÁVEL".

Já ouvi muita história interessante de taxista. Teve um que teve o carro roubado três vezes no mesmo ano, teve outro que disse que não fica com mulher com "kit" (depois ele foi explicar que "kit" é filho de outro casamento). Até história dramática já ouvi: separação com traição, demissão do emprego de anos, ...

Mas nada em momento algum me chocou mais do que a história de um taxista que também era policial e contou a seguinte saga: trabalhando no táxi, foi assaltado certa vez, no que o levaram por algumas horas para um cativeiro e lhe fizeram várias ameaças , o que ele chamou de "tremendo esculacho". Obcecado pelo que lhe aconteceu, o taxista policial ficou por cerca de três meses passando diariamente no horário e no local onde tinha sido abordado, procurando pelos criminosos, até que um dia encontrou seus malfeitores. Contou o taxista: "Aí eu peguei eles e resolvi ajudar a família deles". Até eu entender o que aconteceu, minha ingenuidade já havia me custado meia hora.

E todo esse bla-bla-bla foi, na verdade, para contar a história que não houve. Numa das maiores corridas que eu já fiz, aquela que tinha em potencial um loooongo causo a ser desenvolvido, o taxista simplesmente não deu papo. Perguntou para onde eu ia com voz seca e cansada. Respondeu monossilabicamente à primeira pergunta, com uma voz de enfastiado que inibiu qualquer diálogo. Falei do tempo, e ele limitou-se a fazer uhum. Falei do Botafogo, e ele disse que não gostava de futebol. Botava um ponto final em todas as frases... é, mas diálogo se faz de reticências. Nada mais falei. Vim da Barra até a Zona Sul olhando desolado para a janela. Paguei a corrida e dei um boa noite, no que mal fui respondido.

Mas é o que eu falei no início... taxista e crônica combinam enfaticamente. Veja você... até taxista que não dá papo enseja uma crônica!

domingo, 17 de agosto de 2008

O LIVRO EM CIMA DA ESTANTE

Coitado do livro em cima da estante.
É projeto frustrado em lembrança lancinante.
Sonho levado que se deixou adiar,
quando o sonhador permitiu-se vadiar.

Foi-se o tempo livre que seria tempo livro,
pois incapaz foi o papel na arte da sedução.
Trocado sem dó por filme, sono ou canção,
pereceu na vitrine de inquebrável vidro.

Vidro figurado, mas fronteira intransponível,
entre livro aproveitado e livro figurante.
A missão sempre e sempre preterível,
para a qual por fim me mostro hesitante.

quinta-feira, 7 de agosto de 2008

desperta-a-dor.

Ah, desliga meu despertador,
que hoje meu sono vai até mais tarde.
Desliga meu despertador, segura essa palavra,
palavra não-verbal, ferina, audaz e truculenta,
não digas mais esse acorda com tanto alarde,
não mais, nunca mais.

Desliga meu despertador e acerta meu relógio,
deixa que as horas passem e eu continue a sonhar.
O sonho é tão lindo, maravilhoso e perfeito,
é a ilusão tão doce de que não quero me privar.

Despertador, tenho um aviso a te dar
Vai-te embora, meu corta-barato,
demora-te longe, pedra no sapato.
Não dês em minha quimera seu nocaute sonoro,
não faças com que toda a água me saia de cada poro.

Despertador, teu nome é maldito.
Despertas a dor.... mas que faniquito!
Não te quero mais, deixa-me em paz.
Inimigo, salafrário e algoz, vai!
E sem demora, cala logo essa tua voz! Ai.

GENTILEZA GERA... DINHEIRO

Fique tranquilo(a). Não irei falar de altruísmo lucrativo, caridade com retorno ou p(h)ilantropia.

Lembro uma vez lá com meus doze anos em que via TV e apareceu a tal história de um morador de rua que escrevia em vários viadutos da cidade de forma bastante peculiar vários dizeres filosóficos sobre o mundo, dos quais o mais emblemático era GENTILEZA GERA GENTILEZA. Foi assim apelidado de Profeta Gentileza. Achei a história dele muito interessante e curiosa (a quem interessar, procure no Wikipédia).

Passados mais de cinco anos, Gentileza se popularizou. Não que o Rio ou o mundo tenham se tornado mais gentis, ou que os cariocas tenham enfim se tocado e posto em prática a máxima que ilustra muitas das pilastras do Viaduto do Caju. Fato é que os dizeres GENTILEZA GERA GENTILEZA se tornaram aforismo profundo, atual e difundido, na paradoxal forma que é o cult de massas.

Muito, muito mais do que isso, GENTILEZA GERA GENTILEZA hoje estampa todo e qualquer produto. Já vi camiseta, chaveiro, boné, adesivos,... Esses dias comi em um restaurante em cujo jogo americano lá se vislumbravam as tais três palavras. Os garçons usavam uma munhequeira (!) com os mesmos dizeres. Como se não bastasse, há até até um outdoor imenso com a frase mágica na fachada de um dos mais vistosos hotéis da cidade.

Não dá pra entender, definitivamente, porque é que pegaram uma frase tão legal, verdadeira, capaz de esbanjar uma sabedoria magnífica, expressa em tamanha simplicidade, e tranformá-la em estampa para toda e qualquer pessoa sair por aí pagando de gentil e de atinado para o bla bla bla das virtudes do ser humano que tanto se perdem nesse tão cansativo e batido tal mundo pós-moderno.

É uma tentativa de empreender subliminarmente o espírito da gentileza nas pessoas através da divulgação massiva de palavrinhas mágicas? Algo como um "beba coca-cola" espalhado por todo e qualquer canto? É uma tentativa de relembrar a cada momento a tão sábia lição que o Profeta Gentileza nos trouxe?

Perdoe-me discordar, mas a popularizão da coisa a esse nível tão desconexo e extrínseco tira dela por completo seu enlevo. Vê-la a cada esquina, como mais um elemento de uma paisagem tão contrastante é simplesmente incluí-la nessa paisagem e fazê-la definhar, perdendo seu potencial de causar choque e reflexão. É como aconteca a cada vez que leio na traseira de um carro "Jesus Te Ama". Fico longe de pensar nesse tal amor de que se fala, mas imagino o quão chatalhão religioso deve ser o motorista.

Colocar GENTILEZA GERA GENTILEZA no mais diversificado tipo de produto causa exatamente isso. Gentileza não vai gerar mais porra nenhuma, além de dinheiro. Vai ser, se já não o é, uma frase qualquer, tipo aqueles dizeres com números e palavras em língua estrangeira que constam em camisas de grandes magazines, tipo aquelas que têm todos os estilos, inclusive o seu. Imagine você se daqui a pouco inventam uma camisinha verde e amarela com o GGG escrito. Até imagino o slogan: "para fazer com delicadeza e reciprocidade".

Diriam os indies que esse tal papo de Gentileza está virando muito mainstream. Prefiro a idéia de que a frase tão emblemática perdeu-se no oba-oba do fenômeno pop e na promiscuidade cultural que o mercado de aparências tanto demanda. E assim a coisa vai tendo sua essência transformada. Não que isso seja ruim, afinal, mutações culturais inserem-se num movimento implacável e irrefreável, necessário à própria evolução.

Mas tenham dó. GENTILEZA GERA GENTILEZA é lição tão preciosa no mundo que simplesmente não pode perder sua essência.

TOMBAMENTO JÁ!

quarta-feira, 30 de julho de 2008

PARÊNTESES, a quem interessar

SE MUSE VIER AO BRASIL...
foram muitas as promessas que os milhares de fãs brasileiros fizeram para que o MUSE viesse ao Brasil. Eu particularmente prometi fazer um milheiro de Santo Expedito. Não acho que vá cumprir e talvez tenha que carregar essa dívida eternamente, se a fúria do santo não antes me fizer infortunado.

Teve gente muito desacreditada, pessimista, que disse que iria chover se o MUSE viesse. Eu entendo tamanho pessimismo, afinal, sempre aparecia um ou outro boato de que a banda viria e nada nunca se confirmou. Para terminar, a última turnê já tinha terminado e a banda só fazia uns showzinhos por aí ultra especiais, tipo Rock In Rio Lisboa, para o qual eu cheguei a comprar ingresso mas fui vetado pelos superiores hierárquicos ... mas por que nesse tempo tão morno ela viria pra América Latina, área de público e certezas financeiras duvidosas?

Mas continuando... teve gente que disse que ia chover se o MUSE viesse. Não que no Rio seja incomum chover, mas hoje o dia está muito lindo. Pouquíssimas nuvens, um azul maravilhoso, uma cara de verão. A praia está maravilhosa, a água está deliciosa, ... Tudo está belo. Não creio que vá chover.

Muse tocará em Brasília no sábado, a cidade em que quase não chove (haja secura na nossa capital!). Mesmo os brasilienses que apostaram que choverria se o Muse viesse, tomaram/tomarão na cara.

No mais, o show é daqui a pouco. E a ficha só tá começando a cair agora. Acordei hoje e não tinha me dado conta direito, estava com aquela coisa de que a noite de hoje seria algo comum, tipo ir no bar ou na Matriz. Mas as 10 da noite vão se aproximando, e começo a me tocar do que está por vir. Estou há dois meses evitando ouvir MUSE para ter na hora a sensação de ineditismo. Não quero saber do setlist de outros países. Não quero saber de nada.

Venha o show. Por muito o esperei.

30 de julho.

FECHO PARÊNTESES.

domingo, 20 de julho de 2008

O que fazemos quando não somos observados?

(esse texto estava pronto e esquecido desde abril de 2007 entre os rascunhos do SWB, então vai para vocês)

Pode ser no elevador, no computador, no banheiro, no último banco do ônibus e também no meio de multidões, onde você é apenas mais um. Sozinhos ou não, quando não estamos sendo observados, permitimo-nos ter certos comportamentos no mínimo peculiares.

Primeiramente, vêm as necessidades biológicas, que, como manda o figurino, devem ser feitas em particular. Sim, todas aquelas que envolvem o sistema excretor, o digestório, o respiratório (limpar o salão) e o que mais você quiser. Mas isso, todo mundo faz, até mesmo a Gisele Bundchen, e todo mundo sabe que todo mundo faz. Qual a graça?

Realmente nenhuma. Falo, na verdade, daquelas coisas que normalmente ninguém espera que você faça. Serve discurso na frente do espelho para aumentar o carisma (The Sims?), falar sozinho em outras línguas, e dançar alopradamente no meio da sala, ouvindo som em alto volume e fazendo air-guitar, air-drums, air-microphone ou air-coisa-que-o-valha,...

Vale gritar coisas indecifráveis, fazer aeiou para esticar as cordas vocais e esboçar caretas aleatórias, rindo de si próprio. Há quem lembre de fatos passados e ria sozinho. Há quem chore copiosamente. Alguns fingem atuar, inventam papéis e diálogos e põem-se à dramatização. Sem platéia, é claro.

Tem também aqueles hábitos feios, como jogar lixo no chão ou cuspir o chiclete na rua. Serve deixar o cachorro fazer cocô na rua e não limpar, afinal, ninguém vai saber quem foi. Outra coisa não muito legal é fazer gestos obscenos para alguém quando essa pessoa está de costas. Só tome cuidado para não haver um espelho por perto.

Mas o campeão dos campeões é a cantoria de chuveiro, afinal, ninguém está vendo e ignora-se solenemente o fato de que alguém pode estar ouvindo aquilo tudo, e, pior, achando um saco. Particularmente, eu tenho feito no banho um exercício quase que diário de meta-linguagem: canto Desafinado, do Tom Jobim.

terça-feira, 15 de julho de 2008

19 anos

Estou prestes a completar 19 anos. É daqui a pouquinho. Dessa vez, nada mudará.

Meus primeiros anos de vida tinham o empenho de ir aumentando o número de dedos na mão que eu levantava quando alguém me fazia a pergunta da idade. Fiz uma mão aos 5, fiz as duas aos 10. Para informar a idade, depois das mãos completas, passei a apenas falar: era ridículo ficar mostrando as mãozinhas.

Depois das mãos completas, vieram as aspirações progressivas de adolescente. A primeira delas é a de chegar aos 12 anos. Idade de virar adolescente e de já poder entrar nos filmes com essa censuras.

Os pulos de aspirações daí em diante passariam a vir de dois em dois. Aos catorze, pude ir desacompanhado a grande parte dos shows e, claro, ver os filmes dessa censura.

Os dezesseis mais marcaram uma contagem regressiva para os dezoito do que outra coisa. Ah, claro, como esquecer? Ganhei o tão esperado direito de votar. Lembro do dia em que tirei o título. Devo ter sido dos poucos de minha geração a me sentir um pouquinho mais importante por poder, em proporção gota/oceano, influir nos destinos políticos do meu país.

Os dezoito anos, caraca, os dezoito anos! Merece um tratado à parte. Boate, carro, abrir conta, assinar os próprios documentos, viajar para o exterior sozinho sem autorização do Juizado, identidade verdadeira para tudo, enfim, é o mundo que abre as portas. Um début total, também cercado de responsabilidades, tradução do juridiquês "fim da inimputabilidade".

E agora, os dezenove. Os dezenove não são os dezenove anos. Os dezenove são os dezoito mais um. Nada muda. Só vou ficar mais velho e nada receberei em compensação. Qual a graça?

Todas as conquistas posteriores aos dezoito, não mais são/serão conquistas por mera mudança da idade. Serão minhas próprias conquistas, advindas unicamente do meu mérito, do meu esforço e dos meus destinos. É também a sensação de que ao mesmo posso tudo e ao mesmo tempo nada posso. Sobra a possibilidade, mas me falta a viabilidade. Faltam-me experiência, dinheiro, até audácia... Procuro-os.

Vêm os dezenove, que venham os vinte, que venham os trinta, que venham os quarenta, que venham os mil... os mil desejos traduzidos em um, que farei na hora de apagar a velinha. Que venham os sonhos, que venham em sonhos, que venham de sonhos e que venha o sono quando eu dele precisar.
Que venham as vontades, que venham de trator, que me derrubem em momento oportuno, mas que me façam crescer.
Que venham os ventos e em todas as direções, o que eu quero é me mexer.

A todas as coisas: que venham vindo, que venham quicando, que venham implacáveis, que venham como quiser.
Da vida eu não quero fugir, mas um dia dela me farão escapar. Que venha tudo, que venham todas e que tudo isso e tudo aquilo me façam viver em curtição infinita cada infinitésimo de segundo.

a saga de um trident

O chicletinho estava se sentindo traído. Depois de estar na boca por algum tempo, fora jogado para ser trocado por coisa melhor. Ficara de lado, esquecido em lugar não muito oportuno, em lugar traiçoeiro. Não fora para o lixo por preguiça. Não fora de volta para o papelzinho, porque o papelzinho não mais era àquela altura. Ficara à espreita, tramando vingança.

Seu orgulho estava ferido. Depois de ter sido descartado, nem ao menos um lugar feliz o destino lhe reservou. Dali, assistia a tudo. Assistia ao deleite de que não podia participar, ao jogo das bocas que não mais lhe pertenciam. Ao jogo da oralidade verbal, da oralidade não-verbal. Ao jogo da oralidade que é de fato oralidade e dispensa formalidade.

Decidiu o chicletinho que por fim poria fim àquela brincadeira toda e, sabe-se lá como, jogou-se no meio de campo. Quase um mosh numa platéia de dois.

Suicídio. O chiclete partiu-se em vários. Grudou em tudo. Pegajoso, chicletoso e horroroso. Demorou um pouco a ser percebido e por pouco não foi confundido. Surpreendeu como se fosse uma punhalada nas costas e, como um balde de água fria, fez a alma despertar de uma ebriedade não-alcóolica.

O chiclete, no seu zero a zero que só marca um ponto na tabela, sacrificara seu corpo para lavar sua alma e restaurar seu orgulho. Ascetismo, sacrifícios, loucura,... Mas ele é que foi lavado, em derradeira instância, com água quente e gelo. Fani puro.

quinta-feira, 3 de julho de 2008

A tal maquininha da verdade

Acho insuportáveis essas maquininhas da verdade que alguns programas de TV tem usado para colocar entrevistas no ar e avaliar se as pessoas falam a verdade ou mentem.

Questionado sobre os métodos e resultados, o tal do perito que comanda a máquina chegou a afirmar que quando ela indica "verdade", a chance de acerto é de 95%, enquanto que, quando ela indica mentira, a certeza é de 99%.

Colocaram o Ronaldo, colocaram o casal Nardoni, colocaram inúmeras entrevistas recentes da TV brasileira e ali apuraram, com a majestade da pouca dúvida, o mais pretensioso veredito: o veredito sobre a verdade.

A máquina é bem simples. A entrevista vai passando e um visor na máquina vai indicando desde "verdade" até "mentira", passando por "altamente estressado","imprecisão", "dúvida" e etc.

O tal do perito vai analisando palavra por palavra e chega a dizer que trecho da frase está errado, até mesmo aventando hipóteses sobre porque a pessoa estaria mentindo. Ele é, de fato, um doutor da verdade.

E aí eu me pergunto: o que eu estava fazendo na frente da TV?

sexta-feira, 20 de junho de 2008

CEDENDO LUGAR A UMA GRÁVIDA.

É... o assunto de ceder o lugar permanece rondando minha cabeça. Não levem a mal a ruminância.

Não é novidade dizer que no metrô, no ônibus, no trem e em muitos outros lugares da coletividade urbana há assentos especiais preferenciais para idosos, deficientes físicos, pessoas com crianças de colo e, é claro, para as gestantes.

Não é difícil identificar um idoso: cabelos brancos, rugas, dificuldade pra andar,... são muitos os índices, por mais que seja extremamente difícil precisar se alguns tem mais ou menos que 65 anos. Mas isso é irrelevante, afinal, se a pessoa está com certa dificuldade na locomoção, ninguém vai pedir o documento para comprovar a condição de idoso e assim ceder o lugar.

As pessoas com crianças de colo são o que? Pessoas com crianças de colo. Simples e objetivo.

Os deficientes físicos também se fazem visíveis, seja pelo visível ou pelo invisível: muletas ou membros amputados. Não vale falar cadeira de rodas, pois se o cara preferir sair da cadeira para ir para o assento, já começam a desconfiar, não é?

E uma gestante? Tudo bem... uma gestante com 8 meses fica bem fácil de identificar. Mas e uma gestante com seus 2,3 meses? Com 5,6 meses? Sempre que vejo alguém que tem pinta de gestante, fico muito receoso de levantar e ceder o lugar. Vai que ela é toda encucada com aquela coisa de que "gravidez não é doença"? Vai que ela vai descer na próxima estação e nega a gentileza, me fazendo ficar em pé que nem um idiota?

Mas não é esse meu medo. Eu realmente temo estar diante de alguém que nada está esperando, além do ponto ou da estação em que vai descer. Vai que a suposta grávida nada mais é do que uma gordinha? Não aquelas gordonas, mas uma gordinha, com aquela gordurinha localizada em formato próprio. Como é que eu vou saber? Vou olhar para os seios da mulher, para ver se eles estão inchados? Ai meu Deus, vão achar que eu sou tarado. Vou perguntar se ela é grávida? E se ela encarar isso como uma provação, uma ironia constrangedora?

Levanto ou não me levanto? Pergunto ou não pergunto? Na dúvida... Na dúvida, permaneço na dúvida. Fico a viagem inteira olhando para saber. Se é mesmo uma grávida, estou sendo um babaca. Ela ali precisando sentar, e eu em um conforto do qual sou menos merecedor. Se é só uma gordinha,... como saber?

Avalio mais a tal barriguinha. Não sou conhecedor nem médico, ora bolas. Fico torcendo para ela vomitar, para ela fazer um desejo ultra-especial para a pessoa ao lado, para ela acariciar a barriga com olhar sonhador, para ela atender o telefone e dizer que os dois estão bem, para alguma outra pessoa cumprimentá-la pelo ser vindouro, ... Fico torcendo para ela vir até mim em tom mal-educado - e que seja assim, então! - e falar: sou grávida, pode ceder o lugar para mim?

Nunca teria tanto alívio em ser mal-tratado. E ainda lhe daria os parabéns, do fundo do coração.


"CAUSO" DO AUTOR
No auge de seus 14 anos, Felipe Drummond perguntou à moça da ótica de quantos meses era o filho que ela esperava. Ele jurava que ela estava grávida, mas tinha tanta, tanta certeza, que nem cogitou a hipótese de ela não estar grávida. A resposta foi o "hein?" mais sem jeito e revoltado do mundo. Trauma contado. Próximo!

terça-feira, 17 de junho de 2008

O melhor Sonho-de-valsa da minha vida

Para fugir do tédio das terças-feiras, me mandei para o centro da cidade, onde sempre me aparece algo interessante. Peguei o metrô, onde tive a alegria de encontrar um amigo em plena estação e fomos juntos conversando, sentados. Papo vai, papo vem, e entra uma velhinha no vagão, que, nessa altura, já se encontrava cheio. Logo me prontifiquei a ceder o lugar, que nem reservado era. A senhora agradece gentilmente e ali senta. Fico em pé do lado do banco continuando a conversa, até que sou surpreendido por um sorriso muito gentil e por uma voz doce, de vovó, que se dirige até mim dizendo: "Aceite esse bombom em retribuição à sua boa-educação e à sua gentileza". Seus olhinhos brilharam e os meus também. Agradeci e falei que não fizera nada demais. E não era mesmo. Mas ela acabara de me dar um Sonho de Valsa que teve gosto de Lindt. E nem sei porque joguei o papelzinho fora: não foi um bombom qualquer.

1+1

Estou há um mês sem postar e dessa vez é fácil explicar: estive viajando.
Gostaria de agradecer a todos que não deixaram de visitar o SWB e que não se esqueceram que ele existe. Espero também que tenham gostado dessa repaginada no layout.

Passei três semanas fora do Brasil e pude fazer muitas observações que, à hora certa, depois da reflexão conveniente, serão trazidas a esse espaço.

Aconteceu uma coisa curiosa para mim enquanto pessoa que escreve (escritor fica muito pomposo), que foi a inclusão de um texto de minha autoria (em co-autoria com vários quaisquer do Orkut), o "JÁ ROUBEI NAS LOJAS AMERICANAS" numa prova de Língua Portuguesa da nona série do colégio do qual sou egresso. Foi uma grande honra ser lido por vários estudantes e receber os comentários e o carinho de muitos, que aqui vieram me prestigiar. Muito obrigado. Agradeço também de coração à minha querida ex-professora Tati pela oportunidade, que de certo se inclui em sua proposta pedagógica de mostrar que o ato de escrever não está restrito a grandes nomes de épocas remotas, mas diz respeito também aos perdidos na vida blogueira do tempo presente.

E, por que não lembrar? Hoje o blog fez 2 anos e 1 dia.

domingo, 11 de maio de 2008

que se dane

Que se dane a tristeza dos que não fazem,
o atraso dos que não se anteciparam,
o passo em falso de quem não olhou,
o impossibilidade de quem se esqueceu,
a palavra atravessada de quem não cuidou.

Que se dane, que muito se dane,
quem fez pouco para o inexplicável,
quem ao explicar esbulhou a inocência,
quem ao inocentar imbuiu-se de culpa,
quem ao culpar não mais fez jus ao perdão.

Que se dane, e continue a se danar,
quem para gritar não teve culhão,
quem para amar faltou emoção,
quem para pensar preteriu a razão,
quem para falar perdeu a entonação.

Que se dane, que finalmente se dane,
quem por causa do quinhão perdeu-se do todo,
quem parou no tempo para a vã contemplação,
quem na ambição foi vítima do próprio engodo,
e quem queimou a língua por tanta afobação.

CESSE! Que não mais se dane aquele que
no sofrimento encontrar a estabilidade,
que na esperança encontrar a salvação,
esperando o tempo em sua morosidade,
para salvá-lo, então, num gesto último de redenção.

quarta-feira, 7 de maio de 2008

RAPIDINHAS

TEMPERO CARIOCA
Saiu no Anselmo Gois, do jornal O GLOBO, em 15/4/2008:
"Alô, madames!
Acaba de nascer no Leblon, Zona Sul do Rio, uma grife especializada em roupas para...empregadas. É a Tempero Carioca, das sócias Astrid e Sara Rua. Só vai vender uniformes fashion para domésticas, babás, acompanhantes e afins."
P*** que pariu! Daqui a pouco essas madames vão fazer disputinha para ver quem tem a babá mais bem vestida da parada... só têm que tomar cuidado para a doméstica não despertar a atenção libidinosa do marido, ou na Zona Sul do Rio de Janeiro vai surgir uma loja feita para madames com aquele par de acessórios na cabeça: uma loja especializada em aumentar a altura das portas e o pé-direito dos apartamentos.


ESPELHO ÍNTIMO
Após longa caminhada pela Lagoa, surgiu uma boa idéia de ir a uma famosa rede de sorveterias do Rio de Janeiro. Juro que não esperava rir tanto lá dentro. Foi o seguinte: eu e meu amigo que é testemunha dessa história pedimos nossos picolés e ficamos matando o calor divagando o olhar pela loja, até que em certa hora nossos olhos, quase que simultaneamente, foram de encontro à seguinte plaquinha presa acima de uma geladeira:
"VEJA AQUI O TAMANHO DA SUA BOLA".
Era uma referência a um mostruário com imitações plásticas das bolas de sorvete.
Não conseguimos segurar o riso, que foi estrondoso e vexativo. Saímos correndo da loja e rimos por um quarteirão inteiro, igual dois loucos na rua. Mas isso não importa.
E então eu estava pensando: e no dia em que uma granja resolver colocar mostruários de frangos recém-natos. Nem o Siguimundo explica.


ELEVADOR DE MATERNIDADE
Um fenômeno da criação publicitária:
"Cursos para casais grávidos"
Poderiam expressar de uma forma menos bizarra a idéia de que a gravidez passa pela esfera do homem e da mulher né?
"Cuidado com o seu animalzinho no elevador!" (informe da fabricante do elevador)
Puta merda, where in hell alguém vai levar animalzinho para a maternidade e ainda precisar ter cuidados como "mantenha-o no seu colo", "não deixe que ele suje o ambiente" e etc?

quarta-feira, 2 de abril de 2008

"JÁ ROUBEI NAS LOJAS AMERICANAS"

Não. Eu nunca roubei nas Lojas Americanas. Nem passou perto.

Como uma professora bem disse certa vez, o momento que separa o não-roubo do roubo é o da hora em que a torcida do Flamengo vem toda em cima de você olhar o que você está fazendo.
Eu realmente tenho medo da torcida do Flamengo, mas, mais do que isso, hoje incorporei o valor de não roubar como algo que independe do fato de alguém poder observar meu ato ou das possíveis sanções externas que venham a decorrer dessa incivilidade.

Muito me surpreendeu a existência no orkut de uma comunidade de nome "LOJAS AMERICANAS. VOCÊ JÁ FURTOU?", que reúne mais de 1100 membros numa celebração cinicamente ingênua ao ato ali glorificado de "subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel".

Não consigo ver orgulho nisso, mas tem gente ali com uma tremenda pose de malandro. Se a comunidade servisse apenas para as pessoas contarem peripécias de infância, como muitas realmente fazem, em que tal atitude não pode ser vista como mau-caratismo, mas como inconseqüência e imaturidade, até iria. Mas não. As pessoas, que certamente já não são mais crianças, ali contam o que fizeram na semana passada e o que ainda pretendem fazer.

Certas coisas me chamaram a atenção:

"O meu foi um cavaleiros do zodiaco isso foi a muito tempo, e quando muleque ja tinha as manhas todas, comprar besteiras para pegar a sacola e botar tudo dentro e sair na maior .. esse foi o meu maior furto e o seu ?" Anônimo.
Roubar brinquedo dos grandes já é sacanagem.

"La tinha bala a peso, eu pegava uns 50 gramas de balas pesava e pagava, depois com a sacola aberta eu topava de confeito e chocolates, qualquer coisa ja tava pago mermo. hehehe" Não-anônimo.
Juro que esse "hehehe" foi a pior coisa.

"Foi só uma vez qd tinha uns 12 anos, mas peguei sonho de valsa, batom, creme de cabelo e lápis de olho. Fui uma 2ª vez, mas fui pega! Nunca mais voltei..." Anônimo
A didática da sanção, vulgo aprender na porrada.

"Caraca, amei essa comunidade, pq eu e minha prima qndo eramos pequenas, tinhamos mania de comer tudo qnto era tipo de bala de lá, minha tia qndo nos via fazendo isso ficava pocessa da vida. Até q um belo dia fomos eu, minha prima e meu irmão, (mas nós exageramos na dose), cada um encheu q camisa q estava vestido (sem tirar a blusa) de balas, doces, chocolates e etc e saimos na maior cara de pau. Já na rua, qndo minha tia viu nossas blusas na mesma hora mandou-nos voltar. E o mico de devolver aquilo tudo, ai q horror, foi terrível, nunca mais me esqueço desse dia. Até hoje qndo lembramos disso ficamos rindo muito, mas na hora foi desesperador, mas passou e conseguimos entregar tudo (rsrsrs). Mas tb acho q a criança q nunca roubou uma juquinha se quer das lojas americanas, é pq não teve infância. Sem querer incentivar ninguém." Anônimo
Com essa tia, até o juiz Lalau devolve o que roubou sem pestanejar.

"tipo eh serio... fora um monte de balas e chocolates qnd vou pro cinema faço a feira o meu maior foi sei lah lembro mais naum" Não-anônimo
Repare no tempo verbal do verbo ir.

"peguei um mentos que já estava aberto e comi. dah um pso na consciencia, mas da proxima vez vou ver se dah pra pegar um inteiro, se tiver coragem eh claro! u,u" Não-anônimo
Não ficou satisfeito.

" ja roubei uam bola lah, eu lembro q a bola custava uns 20 conto!!auHAuahUAHuahUAHUa!!foi meu maior furto!!!" Não-anônimo
Legal hein cara!


"Gente naum é por nada mais acho que barrei vcs!!Começo com as guloseimas,parto p/ folhas de ficharios.canetas,lapiseiras(material escolar),produtos de beleza,bonequinho furby(custava na época R$150,00),cartoes de aniversarios.....que vergoinha,paro por aki!!" Não-anônimo
Bonequinho Furby já foi demais, convenhamos. Esses olhos vivos dele tem mais impacto do que "sorria, você está sendo filmado"

"Já roubeu bonecas, coisas da barbie, coisas para cabelo, mas hoje em dia não tenho mais essa cara de pau não." Não-anônimo
É realmente uma questão de cara de pau?

"mas um amigo meu já roubou 7 dvds em um dia só, e o amigo dele já colocou um dvd player que tava em cima das caixas dentro do bag do violao..." Não-anônimo
Diga-me com quem andas, ...

"porra ces são fracos... já roubei um dvd e um cd...é facil só raspar a paradinha do dvd(mas tem q ser vagabundo) com um cartão(tipo riocard q nem o meu) e pegar o cd pu dvd enfiar na mochila e sartar fora!!!!" Não-anônimo
Orkut, a escola do crime.

"um celular com um cartão de crédito fake ;X" Anônimo
Esse roubou as Lojas Americanas e mais alguém, né...

"Eu já catei um DVD lá mas não brigaram comigo pq sou filho do gerente" Anônimo
Santo de casa não faz milagre.

"Eu trabalhava lá e digamos q eu num gastava dinheiro com lanche... :D" Não-anônimo.
Esse merecia ir pro quadro "Funcionário do mês."

"para mim foi um cd do linkin park foi massa bote dentro da minha camisa de manga comprida o alame estava com defeito ai eu comprei um cd para a minha mãe ainda possima robei um cd do linkin park" Não-anônimo
Essa certamente me lembrou "meu guri" do Chico Buarque. "Chega suado e veloz do batente e traz sempre um presente pra me encabular."

"Ja tentei Sair Com um PS-2 mas o Seguranca Disse q eu so sairia se Pegasse Um pra ele xD Ai eh Fodz" Não-anônimo
É aquele papo: você tem que me ajudar para eu te ajudar.

"To pegando todo dia um boneco dos cavaleiros dos zodiaco, original. Que custam 110 reais. Furta e uma palavra muuito forte, vamos dz q eu to pegando oq a sociedade me deve ;D." Não-anônimo
Essa realmente me chocou. Como se não bastasse o ato de furtar ser praticado diariamente, como quem monta uma coleção, o rapaz ainda argumenta mal e porcamente de forma a tentar justificar seus furtos.
Aliás, começa dizendo que ele não pratica furtos, pois esse é um termo muito forte. Pô... vai dizer que é expropriação revolucionária? São outros tempos, meu camarada.
Vem o absurdo: ele só está pegando o que a sociedade lhe deve. Pergunto-me em que o rapaz foi lesado para merecer reparação? De que lógica ele parte... a lógica do pobre coitado? A lógica da compensação? Bem, acredito que lógica da compensação não parece ser válida se praticada de forma não-institucionalizada.
Mas então... desde quando a sociedade deve um boneco do Cavaleiro do Zodíaco a alguém? Daqui a pouco vem gente dizer que a sociedade deve um Rolex a todo mundo. Volto à pergunta: de que lógica ele parte? Não parte de lógica nenhuma, de ideologia nenhuma. Faz o furto e tenta justificar com qualquer porcaria de argumento. Totalmente ilegítimo. Meu Deus... quando eu leio esse ";D" minha raiva aumenta ainda mais.

Alarme PIPIPIPIPIPI de porta para todos esses aí. Tenha dó.
Que venha a torcida do Flamengo.


A SE PENSAR...
Porque o crime de pirataria, hoje tão comum e praticado, não é tão estigmatizado? De maneira essencial, ele é um roubo. No entanto, creio que ele vem se tornando legítimo, por significar fator de não-alienação cultural/informacional a muitas(quase todas) pessoas. Nesse sentido, para amenizar o problema, vale levantar também as iniciativas não apenas do Radiohead, com o inovador sistema de lançamento do último disco, como também das várias empresas que desenvolvem software livre e nem por isso logram insucesso financeiro.

terça-feira, 25 de março de 2008

23 formas de ser FOFO(a)

A tem um chaveiro de pelúcia;
B troca a's por alfas no nome do orkut;
C vai em projetos sociais para tirar fotos;
D só usa calcinhas com motivos infantis;
E tem um telefone rosa;
F compra balinhas a mais para distribuir na sala;
G sempre traz presentinhos furrecas das viagens;
H dá sorrisos forçados;
I é tão prestativo que beira a canonização;
J fala qualquer coisa só para estar falando;
L com tudo concorda;
M tem fotos espontâneas forjadas;
N fala com voz de criança;
O só conhece o futuro do pretérito;
P usa o miguxês;
Q ganhou o prêmio "clichês de orkut" do So What's Beyond!;
R sempre cita uma frase feita da revista capricho;
S finge saber como as mulheres pensam;
T tudo anota;
U tem uma emoticon para cada hora;
V é a voz da pieguice;
X não fala palavrão;
Z escreve qualquer coisa nos comentários.

Ai, que graça.

sexta-feira, 14 de março de 2008

GARFADO.

Depois de um texto que está parecendo (apenas parecendo, eu enfatizo!) proselitismo babaca da Campanha da Fraternidade, que se manifesta contra o aborto e o uso de células embrionárias em favor da valorização da vida (há controvérsias), trago aos meus leitores - só leitores, porque não comentam - um texto retirado das percepções mais loucas do meu ser.


GARFADO.
Padeço de uma sensação péssima toda vez em que alguém passa com um garfo e olho para as suas quatro pontas. Imagino aquele instrumento indo de encontro ao meu peito e fazendo algo como guelras em minha pele. Imagino a dor que sentiria. Imagino a dor que se multiplicaria quando eu olhasse aquele estrago.

Imagino-me num filme, num dramalhão desses, levando uma garfada. Sou atacado e mantenho a serenidade e, olhando nos olhos de quem me garfou, puxo o garfo para fora do meu peito sem mudar minha expressão, sem soltar um ai sequer, como se estivesse resignado a morrer dali em diante. E aí, então, solto o garfo no chão, que cai fazendo um grande barulho. O filme tem suas cores em degradê de sépia e as nuances de meu rosto assim se fazem mais visíveis. Falo alguma palavra de vingança em tom monocórdio, fecho os olhos e caio duro ao duro chão. Outro barulho forte. O filme, ou a cena, acaba com um close no garfo meio ensangüentado, que assim chega a brilhar bastante.

É duro. Não consigo comer um bife olhando fixamente para a hora em que o garfo o espeta. Por mais que aquela carne esteja descaracterizada, é carne. O garfo no bife é o garfo em mim, o garfo em meu peito, o garfo que não consigo suportar. O garfo que me faz guelras, o garfo que dilacera minha pele, o garfo que expõe meu sangue, o garfo que bota em uma moldura minhas entranhas, o garfo que eu quero longe de mim.

O garfo que leva a carne à minha boca.
A minha boca que vai à carne.
A boca que vai à minha carne.

... que tortura!

quinta-feira, 13 de março de 2008

AMBULÂNCIA

Toda vez em que uma ambulância passa é a vida de alguém que está quase indo para o beleléu.

Para você que está caminhando na rua e ouve aquela sirene ensurdecedora, é mais um "barulhinho" que te chama a atenção num lapso. A luz vermelha girando loucamente, o motorista vestido de branco dirigindo atento, com a coluna curvada para frente, aquela luz interior da parte traseira do veículo, que, por um vidro opaco, sinaliza somente que ali há vida à beira da morte.

A ambulância corre tanto, que vem tão rápida e se vai tão rápida que o beleléu é uma abstração para terceiros: não existe, não se faz sentir. O beleléu só é beleléu para quem ali está, entre o tudo e o nada, ou para quem acompanha quem ali está.

A ambulância é mais um elemento de uma paisagem catastrófica urbana. Tão banal. É a sirene que vira poluição sonora. É itinerante e intermitente. A certeza do "de vez em quando". É o motivo da curiosidade das crianças, que sempre querem entrar numa ambulância e ver o que tanto tem lá dentro.

A ambulância, em toda sua pressa e e prerrogativa legal de livre trânsito, pode servir para desafogar o tráfego. Pode atrair espertinhos que vão atrás dela aproveitando-se do espaço aberto pela urgência e pela solidariedade aos necessitados. Espertinhos para os quais a vida de alguém que está indo para o beleléu é só mais uma facilidade que o acaso lhes deu de presente, quase que advinda de alguma espécie de princípio de conservação da bonança.

Talvez o que separe a ambulância do carro da funerária, além do vermelho e do preto característicos, seja o fio de esperaça que uma tem e a outra não. A iminência não é a certeza. A ambulância é um flerte. O carro da funerária é um beijo. A pressa e a calma. A instabilidade e o retilíneo.

E se em algum momento a ambulância que voava aos brados de cor encarnada e pintada de múltiplos decibéis desliga sua sirene no meio de um percurso e diminui a velocidade? Um fechar de olhos, um último suspiro. Seria o momento mais poético das vias da cidade. A hora em que a ambulância sinaliza seu fracasso, sua insuficiência, o fim de sua esperança. A desistência. A hora em que todos os carros param, que todas as sirenes, buzinas e gritarias se desligam e há um mergulho no silêncio sereno de uma efemeríssima eternidade - a hora em que tudo pára para a contemplação -, o silêncio de respeito à hora em que a campainha do beleléu tocou e a porta foi aberta para alguém entrar.

Toda vez em que uma ambulância passa pode ser a hora de se refletir sobre alguma coisa que a cerca. Mas é difícil pensar em algo nessa hora porque ela é rápida e impessoal. Isso a torna abstrata. Isso reduz ao trivial a luta que ali dentro se trava. As ambulâncias deveriam trazer um letreiro externo eletrônico contendo os seguintes dizeres, ao lado de uma foto do indivíduo em atendimento num momento feliz de sua vida:
ESTAMOS TENTANDO SALVAR A VIDA DE FULANO DE TAL.

E se as pessoas parassem suas vidas quando vissem uma ambulância para começar a rezar, a mentalizar coisas positivas para a vítima?
As ambulâncias deixariam de ser mais umas ambulâncias dentre várias que escandalosamente se manifestam.
A vítima deixaria de ser mais uma vítima, mais uma estatística.
Os pedestres deixariam de ser só mais alguns andando na rua para formarem uma torcida.

A lógica do "é só mais um, então dane-se" e a lógica do "inevitável, então deixa para lá" deixariam de ser a tônica de como a vida vê a vida, da forma como o semelhante vê o semelhante.

A hora da ambulância seria o chamado recorrente, material, sonoro e colorido de que a vida deve celebrar a vida. Uma tomada de consciência. Um estalo. Uma forma que o Dr. Acaso, renomadíssimo publicitário, achou para divulgar, ainda que objetivando alguma percepção do inconsciente, o produto que ninguém precisa comprar, pois é o bem que todos já têm. Bem perecível, cuja data de validade não se conhece e que, cedo ou tarde, mal ou bem, encontra no beleléu seu pouso derradeiro. Seu repouso.

sábado, 1 de março de 2008

RAPIDINHAS

IMPACIÊNCIA.
- Vó... vó... eu preciso comer comida árabe.
- Por que?
- Porque eu to grávido e se não comer meu filho vai nascer com cara de esfirra.

COAXO.
Casal de uns 16 anos passeando pelo shopping em clima romântico pára em frente da loja de utensílios domésticos e de presentes para casamento, quando a menina aponta muito animada e saltitante para várias coisas na vitrine. Vira-se para o rapaz impetuosamente e fita-o com cara de "eu quero", no que é respondida pelo moço com uma fisionomia desconcertada, como se o pedido fosse extremamente inoportuno. O rapaz coaxou.

Ok, relatado.

PARONÍMIA
Sinto cinto quando sento.
Sinto que aperta no assento.
Cinto que aperta com acento.
Da cintura, há perto aperto.

OLIMPÍADAS
li no informe: "rio 2016: cidade aspirante"
1. viva a cocaína.

DISNEY 2008
É impressão minha ou eu fui o único que não foi pra Disney nessas férias?
Tô quase fazendo um álbum "Disney 2008" no meu orkut e colocando uma foto com um zero cortado, tipo um conjunto vazio. Talvez seja o bolso que esteja vazio.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

SOBRESSALTO.

O cabelo sorvetão e o excesso de maquiagem tudo revelavam sobre a idade daquela senhora que, com um bando de bolsas de lojas chiques, andava pela rua sobre um salto barulhento, capaz de ser ouvido mesmo com os ruídos da rua.

Andava de nariz erguido e tinha um olhar esnobe. Talvez fosse esposa de empresário ou alta aposentada do serviço público. Tinha cara de viúva, daquelas que descobrem a vida com a morte do marido.

Suas sacolas nada mentiam sobre suas possibilidades. Somente marcas caras, tirara o dia para renovar o guarda-roupa. E o salto talvez tivesse significado simbólico para além do estético. O salto era daquele tipo não-sandália. Hum.... acho que não fui elucidativo. Bem, não entendo de saltos, mas o que aqui descrevo prendia-se que nem um tamanco.

Volto ao que me chamou a atenção. Velhas como essa, embora se achem a última bolacha do pacote, acham-se por todo canto. Mas não é todo dia que o trânsito pára por causa de uma delas.

Tudo começou na incivilidade da senhora, que pôs o pé na rua e caminhou até a intersecção entre a faixa lateral e a central, ou, melhor dizendo, que foi para o meio da rua. Levantou sua mão de forma quase libidinosa, como se fosse colocá-la sensualmente à boca, e ficou agitando os dedos, como se aludisse a outra coisa impudica. Tudo isso para chamar um táxi que se aproximava.

O buzinaço começou. A velha parou o trânsito no meio da rua. O táxi parou todo errado para que ela entrasse no ponto em que estava, afinal, uma madame daquela se movimentar de encontro ao meio-de-transporte feriria o orgulho de um ser tão high-profile. O motorista, que economizou na hora de comprar o carro e não colocou as benditas trancas automáticas, teve que dar um quase 180 digníssimo para abrir a porta traseira do carro. E as buzinas não paravam.

Assim que a porta abriu, a ilustre senhora começou a colocar, em cínica tranquilidade, as sacolas para dentro, empurrando-as para o outro lado do banco. Chegada a hora de finalmente entrar no táxi, ainda lançou um olhar indiferente aos automóveis barulhentos que atrás se amontoavam, manobrando com dificuldades para tentar seguir caminho.

Para sentar, colocou-se de costas e sentou seu traseiro gelatinoso no banco, ainda com os pés para fora do automóvel. Depois, deu uma viradinha e colocou um pé no carro. Depois, a mu... não houve depois para o movimento de embarque. O taxista percebeu que havia um guarda de trânsito por perto, que, felizmente, num raro momento de distração em que conversava com um guardador, não percebeu o circo instalado naquela rua. Temeroso por uma multa, tratou de dar uma arrancada.

Na arrancada, a senhora apressou o movimento, mas, na imprecisão de uma mexida em espasmo, um dos pés de seu salto acabou caindo no chão, solitário e reluzente. Com a porta meio-aberta e com um pé enrugado à mostra, o táxi seguiu adiante apressado, deixando o salto para trás. Jogado no meio da rua, o salto ainda atrapalhava mais o trânsito, pois ninguém conseguia simplesmente passar em cima daquele ostensivo acessório. Os mais irritados até pensaram que o ato de deixar o salto no chão foi premeditado, significando um "big foda-se" da velha, que, ao invés de exibir retratação pelo transtorno que causara, quis tirar mais uma com a cara dos motoristas que há pouco atrapalhara.

O táxi não pôde andar muito, pois logo o sinal fechou. Estava distante uns cinqüenta metros do salto abandonado. Uma eternidade que a equação t=s/v não ousaria descrever e que poucos tentariam enfrentar. Mas teremos a nossa heroína.

Já dizia a filosofia de botequim que ninguém gosta de sair do salto. A porta do táxi se abriu e de lá saiu uma velha. Primeiro pôs os pés pra fora. Um deles estava descalço e era meio enrugado. O outro vinha sobre um salto. Puxou suas compras e saiu do táxi. Simulando ser o Garrincha, pois jamais teria a humildade de descalçar o salto que restara, a senhora caminhou a passos curtos e tortos rumo ao salto que deixara cair. Caminhava no meio da rua, novamente parando o trânsito e suscitando as ensurdecedoras buzinas.

Quando estava quase alcançando o polêmico calçado abandonado, a senhora tropeçou. Foi literalmente um salto rumo ao chão. Pááááá! Sentiu ela a dureza do asfalto, ficando estática. Em instinto vingativo, ninguém queria parar para ajudar a pobre malfeitora, mas todos acabaram parando.

E o trânsito novamente parou. Dessa vez, porém, as buzinas cessaram, afinal, não havendo como executar um réquiem, preferiram fazer um minuto de silêncio.

- Mas vaso ruim não quebra mesmo! - gritou um motorista para fora de seu carro, quando viu a velha voltar a se mexer, ainda no chão, logo exclamando em voz sinuosa: "mas não chame o 193, quero a ambulância do meu plano!"

sábado, 23 de fevereiro de 2008

pós-epílogo.

Foi-se.

Para o enfermeiro, foi o último acontecimento do seu plantão.
Para a família, foi dor.

Para o cara da funerária, foi o ganha-pão.
Para a família, foi sofrimento.

Para o escriturário do cartório, foi o terceiro atestado de óbito do dia.
Para a família, foi tristeza.

Para o jornal, foi um nome no obituário.
Para a família, foi pesar.

Para o coveiro, a segunda vez que pegava na pá.
Para a família, foi adeus.

Para o padre, foi mais uma missa.
Para a família, foi penar.

Para o INSS, foi menos um aposentado.
Para a família, foi comoção.

Para a Justiça, foi o inventariado.
Para a família, foi a herança.

Para o IBGE, foi a estatística.
Para a família, foi duro.

Para a vida, foi o fim.
Pára a vida: é o fim!

Para a família, virou lembranças e saudades,
enclausuradas na moldura de um porta-retrato,
ou guardadas numa das redomas acrônicas do coração.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

a moda engajada do próximo reveillon

lançarei moda:
ano que vem, passem o ano novo de laranja.
façam uma homenagem a quem desfaz o que fazem no ano novo.
façam uma homenagem a quem cata as garrafas caídas e as garrafas arremessadas.
façam uma homenagem a quem limpa os caroços das uvas e os bagaços de um ano velho.
façam uma homenagem a quem recolhe todos os cigarros e as cervejas da ebriedade alheia.
façam uma homenagem a quem não estoura o champanha, mas cata a rolha.

ano que vem, passem o ano novo de laranja.
pode não ser a cor da paz, mas é a cor da limpeza, mais do que o branco.
e sem superstições.

sábado, 19 de janeiro de 2008

PAUSA.

Atravesso um momento infeliz para esse blog. Não consigo sentar e escrever, não consigo ter fluidez em minhas palavras. Falta-me inspiração. Sobra-me vontade.

Penso em tantas coisas na rua que dariam bons textos, mas a efemeridade de um pensamento é tão implacável quanto frustrante. As coisas se perdem. Minha cabeça não está boa.

Ficarei um tempo sem escrever.

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

SOERGUIMENTO.

Meu prazer em revirar quinquilharias me fez esses dias descobrir algo inusitado na sacola de supermercado onde guardamos as fotos de família muito, muito antigas. Em meio ao preto e branco nostálgico da distante mocidade de minha avó, encontrei perdida a fotografia de uma senhora que ninguém em casa soube dizer quem era.

Fiquei intrigado - seria forçação dizer encantado - com a pessoa que não quis posar para a câmera e seus olhos fechou. Num misto de proeminência e de anonimato, a musa que hoje inspira o verbo tem o ar de uma vovó moradora de rua, embora não me pareça uma qualquer, ou, do contrário, não teria sido motivo para uma foto.

Seu vestuário esquisito talvez fosse seu charme. Um vestido preto, sem brilho. No pescoço, algo como um pano de chão desfiado que simula um echarpe. Em suas mãos, como se fosse a "miss rugas 1940 e porradas", um cetro ornamentado. O chapéu que compunha o look era a última moda em... não sei onde a foto foi tirada.

Minha velhinha da foto permanece uma incógnita. Seria ela uma pedinte? Uma louca que a família não quis manter em seu seio? Uma exótica? Uma assídua por brechós? Uma "nada" abandonada que alguém achou engraçado e quis registrar para a posteridade?

Resgato hoje esse registro e mergulho na imaginação, como num passeio a uma feira de antiguidades. Meu Deus, o que essa foto fazia no meio de várias outras fotos que nada tem a ver com ela? A idosa desconhecida é uma viagem, uma abstração. Hoje está morta, eu tenho certeza, e agora se faz viva, eu também tenho certeza. Hoje está eternizada na internet. Daqui a pouco vão digitar no Google alguma coisa qualquer e ela vai aparecer. Estilistas descolados buscarão nela inspiração para seus próximos desfiles. Gurus tentarão adivinhar a cor de seus olhos. Psicólogos decifrarão seu pensamento. Sua bizarrice vai comover multidões. Reconhecimento post-mortem.

sábado, 5 de janeiro de 2008

O COPO

O copo é objeto fundamental das às vezes etílicas confraternizações sociais, nas quais bater os copos um nos outros é a apoteose do momento.

O copo é um objeto democrático. Todos usam, mesmo que diferentes copos reproduzam as estruturas sociais vigentes, indo desde o copo de requeijão ao cálice da mais nobre vidraria.

O copo é curioso. Em sua lascívia fálica, materializa a promiscuidade. Uma cópola plural. Passa de boca em boca deliberadamente. Experimenta de tudo, em todos. O copo é a via da dispersão: dispersa micróbios, dispersa angústias.

E depois de tudo, quando há copos vazios, de tanto que a cara encheram, o copo vai para a purificação hídrica remir-se de seus pecados.

"Em mão de bêbado, copo fora do escopo é certeza de ex-copo."