GUIA DE LEITURA

Se você me perguntasse quais textos ler, eu diria para CLICAR AQUI e achar uns 20 e poucos que eu classifiquei como os melhores. Mas vão alguns de que eu particularmente gosto (e que fizeram algum sucesso):

Caritas et scientia
(as saudades da minha escola)
A-Ventura de Novembro
(o retrato de um coração partido)
Vigília
(os sonhos nos enganam...)
Sairei para a boate e encontrarei o amor da minha vida
(ou "elucubrações esperançosas")
(a afeição por desconhecidos)
A tentação de Mãe Valéria
(trago a pessoa amada em três dias)
A nostalgia do que não tive
(a nostalgia do que não tive)

quarta-feira, 20 de junho de 2007

SAMY DA BOLIVAR NÃO TEM A NAMORADA.

Pode parecer manchete de jornal, reportagem de capa de revista de fofocas ou até mesmo mensagem de telegrama em código, mas é essa a mensagem escrita num dos principais túneis da cidade.

Quem é Samy? O que é Samy? Com esse apelidinho nada masculino, fico na dúvida do sexo e também da opção sexual desse personagem (ave substantivo comum de dois gêneros!) infeliz que não tem a namorada. E o detalhe mora aí: ele não é um solteiro qualquer, que não tem namorada, ele simplesmente não tem a namorada. Na verdade, fico pensando se esse(a) tal é mesmo solteiro(a) ou se ele(a) é negligenciado(a) pela namorada, num namoro de mão única.

Para ser conhecido como Samy da Bolívar, creio que ele tenha alguma relevância nesse grupinho ou nesse lugar que se chama Bolívar. Vai ver é o chefe de uma trupe de pré-adolescentes que aterroriza parquinhos infantis ou que joga ovos na careca dos velhinhos. Pode ele estar na época de descobrir o amor, envolvendo-se naqueles casinhos infantis em que a menina ainda morre de vergonha de andar de mãos dadas ou de beijar o rapaz, daí parecer que eles nem namoram.

Mas volto à tal da namorada. Quem seria essa moça tão estimada capaz de esnobar o honrado Samy da Bolivar? Será que ela recebeu flores no Dia dos Namorados ou ganhou um presentinho de nosso amiguinho Samy? Será que Samy é tão romântico? Imagino Samy indo à floricultura todo animadinho, comprando umas flores a dedo, ensaiando um versinho e, ao declamá-lo e entregar o presente à namorada, ser tomado em deboche pela parte amada. Será que Samy lamenta a falta de reciprocidade da relação?

Eu sei lá. Só vi que no túnel tava escrito que ele não tem a namorada. Na verdade, acho, ou tenho certeza, de que Samy não tem bons amigos. Pensando bem, quem pegaria seu spray de grafite para espalhar pelas ruas da cidade um problema amoroso entre um casal de namorados? Talvez um mal-amado também desejoso do afeto da moça. Talvez alguém que queira se vingar do maquiavélico Samy, que já tramou ciladas para muita gente. Talvez um louco, o próprio Samy!, que adora referir-se a si próprio em terceira pessoa, num relato auto-biográfico.

Realmente não sei. Mas que está lá, está lá. E para quem quiser ler. Passando de ônibus rumo ao trabalho, voltando para casa, cruzando o bairro ou até mesmo espairecendo na urbanidade do túnel, todos tomam conhecimento de que Samy da Bolivar não tem a namorada. Anúncio profético, revelador, momento apoteótico da vida de qualquer um, capaz de mudar a rotina de muita gente.

sábado, 16 de junho de 2007

Bolo e guaraná... é o seu aniversário!




Não sei quando o So What's Beyond foi pensado, mas sei que ele veio ao mundo dia 16 de junho de 2006. Lembro que era uma daquelas sextas-feiras de tédio e que eu estava com muita vontade de escrever algo além daquelas dissertações escolares quinzenais de 25 linhas.

E assim foi feito."So What's Beyond?" nasceu com uma mensagem meio pretensiosa de apresentação, alguém querendo posar de enigmático. Até hoje não entendo porque batizei o blog com esse podre e também pretensioso nome em inglês. Se fosse hoje, não colocaria nada nessa língua, mas usaria um nome brazuca do melhor estilo.

Meus primeiros textos tinham como tema básico os relacionamentos e o comportamento humano, com enfoque em alguns sentimentos como a amizade (e as críticas a algumas hipocrisias - como eu gosto disso), o alívio, o sofrimento por antecedência, entre outros. Às vezes o SWB ficou um pouco auto-ajuda, como aconteceu com o texto do sucesso, fruto de muita reflexão e conversa prévias. Certo dia, resolvi expôr algum sarcasmo e acidez, num texto levemente humorístico sobre os clichês de orkut, que teve sua segunda edição há pouco tempo. Ambos posts receberam muitos comentários e elogios, bem como a outra sátira bem recente informações úteis.

Mas teve um dia em que eu sentei inspirado na cadeira do PC e escrevi, numa tacada só, um texto que eu considero um divisor de águas entre minhas publicações. Os que me conhecem, sabem que esse é um dos meus preferidos. Tá aí, "Como se sente uma pessoa depois de matar alguém?" a razão por que já me chamaram de mórbido, maluco e etc. Ok.

Outros relatos com comentários filosóficos e comportamentais também marcaram presença nesse um ano de blog, como é o caso do texto sobre o pombo que presencia a agonia de seu semelhante, e do meu queridíssimo "pisando em fezes", uma descrição quase-emocionante das reações de quem se apóia onde não deve.

Mas foi pelas crônicas que eu descobri grande vocação, a começar pelo hilário "mundo e os gordinhos" , que trazia a descrição de um fato que me aconteceu de verdade e algumas críticas (mal-feitas) a certos aspectos sociais vinculados à obesidade. As rapidinhas (I, II e III) também trouxeram historinhas engraçadas do cotidiano, além de outras notas mentais de fácil digestão, valendo destacar a rapidinha IV, que trouxe um desabafo sarcástico contra a calamitosa criminalidade. Noutro dia, quis escrever sobre uma observação socio-econômica que há muito já fazia, e saiu um panfleto de "reajustem a esmola". Outra mensagem de cunho social que destaco foi o relato quase-emocionado do trabalho duro de muita gente que não tem emprego, baseado num dia de perambulação pelo centro do Rio, onde várias coisas me tocaram. Destaco também a crônica do consultório médico, construída após muita observação in loco.

Superei-me na introspectividade com o texto sobre "a morte (alheia) - sic", que aborda essa tão discutida questão humana da ótica de quem fica , e também com a imperdível análise sobre as várias modalidades do ato de chorar . Mas um dos meus preferidos dessa linha é o ensaio sobre o ato de burlar, escrito num momento de certa inspiração.

Fiz também um texto enigmático num momento de raiva, em que eu me impunha certa censura, tamanha minha covardia para dizer com palavras ofensivas e diretas que eu achei certa coisa uma grande bosta. A senha para ler o tal texto poucos descobriram, e quem o fez viu que não havia crítica nenhuma ao carnaval, mas sim à carnavalização de certas coisas.

E um dia, depois de muitos textos num certo padrãozinho, acordei com vontade de fazer um texto maluco (para os meu padrões) . Eu tinha um rascunho sobre a preguiça humana, que sairia como mais um texto normal "conto que ilustra x. o que é x? exemplos de x", mas eu de repente mudei a história toda e botei Noé no meio, numa alucinação de ares apoteóticos, e assim saiu "a hora de abrir o guarda-chuva". E não expliquei nada, cada um entendeu uma coisa, foi uma barbaridade. A mesmíssima coisa aconteceu com o texto (prosa? poema?) que mostra a observação de várias pessoas interrompendo suas atividades para irem à janela verem se um carro se espatifou logo embaixo. Nada diferente na penúltima postagem, o conto que reputo como um dos mais interessantes, pela história e pela crítica: "E tudo termina em..." .

Chegamos aqui, à mensagem de um ano do SWB, após uma breve e pouco linear retrospectiva das águas que rolaram nesse período. Eu preciso agradecer a todos vocês que por um ano leram o blog, comentaram e participaram de alguma forma. Essa interatividade é muito gratificante, e vocês não fazem idéia de quanto eu fico feliz quando me contatam no MSN ou me param na escola para dizer "Pô, sabe aquele texto? Achei muito legal!".

Daqui a pouco vou ficar sem palavras.
Muito obrigado, meus caros.

Até o próximo ano... :-)
Felipe Drummond
16/6/2007

segunda-feira, 4 de junho de 2007

E TUDO TERMINA EM...

Era madrugada e não chovia. Chegou à delegacia um homem, fortinho, com seus 25 anos, acordou o funcionário de plantão e avisou rapidamente que estava indo para a sala do delegado, recebendo como resposta grunhidos indecifráveis. Rumou ao fim do corredor e, esmurrando a porta do Dr. Silveira, desatinou a falar para o também dorminhoco delegado, sem perceber que esse estava passeando nos recantos do inconsciente, numa Pasárgada onde os delegados podem dormir à vontade.
- Dr, eu matei uma pessoa.
- Mmmmm, aaaaahhh... só daqui a pouco, vai.
- É o senhor quem sabe.

Sentou-se na cadeira impaciente, enquanto o delegado ajeitou-se na poltrona, encostando sua cabeça no estofado, sem antes coçar seu sobressalente papo. Depois de ver o delegado roncar e até mesmo babar, o cidadão resolveu pronunciar.

- Delegado, eu matei uma pessoa. Vim aqui confessar, oras!
- Confessar o que... eu lá tenho cara de padre? - respondeu o agente da lei, tentando emergir ao estado de vigília.
- Doutor... você pode achar estranho, mas... eu matei o padre!

O delegado esboçou um franzir de sombrancelhas e repetiu, sílaba por sílaba, sem demonstrar qualquer exaltação digna da comoção esperada pelo assassinato do padre do bairro.

- Vo-cê-ma-tou-o-pa-dre?
- Matei. A pauladas.

O delegado levantou-se da cadeira, ajeitou o colete, respirou fundo e pronunciou-se a respeito.
- Ahn... bem... vamos fazer o boletim de ocorrência.
- Mas eu não vou ser preso? - perguntou o assassino com uma pontinha de esperança.
- Calma calma, vamos por partes.

O delegado sentou-se à máquina de escrever e começou a datilografar. "Rio de Janeiro, 28 de fevereiro de 1971" Sonolento que estava, demorou a perceber que a máquina estava sem papel.
Abriu a primeira gaveta e tateou-a em vão. Abriu outra gaveta e nada.

Olhou para a máquina, a máquina olhou para ele. E nada. O delegado virou-se para o criminoso confesso e fitou-o com um olhar insípido, como se estivesse diante de um "ladrão" de amostra grátis de supermercados, aqueles que pegam várias vezes a amostra para não ter que comprar o produto. Abriu a boca, mas hesitou em falar. Respirou fundo e disse em ar solene.

- Olha, meu filho, estamos sem papel para fazer o BO. Se você puder voltar amanhã, em horário comercial, eu ficaria agradecido.
- Mas doutor...! - falou o assassino, estupefato com o que ouvira.

Talvez o delegado fosse inimigo do padre. Talvez fosse anti-eclesiástico. E talvez fosse o sono o responsável por tamanha indiligência. Ou talvez fosse a fome. Fato é que o delegado, sempre que acordava, tinha uma fome da pesada.

Abriu sua agenda de telefones e ligou para a pizzaria mais próxima. Nessa hora, o funcionário de plantão e seu estômago já estavam bastante despertos. Cordial como só, o delegado ofereceu antecipadamente o alimento ao subalterno e ao homicida.

- Vocês aceitam?

Não tardou e todos compartilharam do mesmo pão (com queijo, orégano e outras coisas em cima). E o vinho? Bem... se a igreja mais próxima, onde naquela exata hora putrefazia-se o corpo do padre, não fosse tão longe, era só ir lá buscar que a ceia estaria completa. Ninguém iria notar mesmo.