GUIA DE LEITURA

Se você me perguntasse quais textos ler, eu diria para CLICAR AQUI e achar uns 20 e poucos que eu classifiquei como os melhores. Mas vão alguns de que eu particularmente gosto (e que fizeram algum sucesso):

Caritas et scientia
(as saudades da minha escola)
A-Ventura de Novembro
(o retrato de um coração partido)
Vigília
(os sonhos nos enganam...)
Sairei para a boate e encontrarei o amor da minha vida
(ou "elucubrações esperançosas")
(a afeição por desconhecidos)
A tentação de Mãe Valéria
(trago a pessoa amada em três dias)
A nostalgia do que não tive
(a nostalgia do que não tive)

sexta-feira, 24 de agosto de 2007

MOMENTO POEMA.

Poema... coisa que raramente faço. Então vão dois escritos recentemente.
Gostaria de dizer que o primeiro, por mais incrível que isso possa parecer, foi escrito num dia em que estava muito feliz e animado. Sei lá como ele apareceu.


CAMINHO ATÉ A BEIRA DO PENHASCO
(mas sem coragem de dar o último passo)

Quando tudo parecia dar errado,
surgiu o milagre.
Quando tudo parecia dar certo,
surgiu o imprevisto.
Quando tudo tendia a fúria,
surgiu a palavra.
Quando não havia mais palavra,
fez-se o silêncio.

Quando tudo era silêncio,
fez-se o escuro.
E aí, tudo pareceu perdido,
e não surgiu um norte,
e não surgiu a sorte.
Também não surgiu a morte,
e ficamos a ver navios,
porque não deu pra soltar as amarras.



NÃO É NO GOOGLE
Procure espaço,
procure o compasso ,
procure o escasso,
procure um traço.

Procure o ócio,
procure negócio,
procure o sócio,
procure consórcio.

Procure conforto,
procure o porto,
procure torto
procure o horto.

Procure o fio,
procure o Rio,
procure no cio,
procure o plantio.

Procure, enfim,
procure assim,
procure o fim...
Procura sem fim.

E O CALENDÁRIO DE 2020

Hoje é 24 de agosto de 2007. Diga-se de passagem, completam-se 53 anos do suicídio de Vargas. Pegue o calendário de seu celular ou do PC e veja o dia 24 de agosto de 2020. O que você vê? Um dia em branco? Uma nebulosa?

Futuro, meu caro futuro, ele está lá. Coisa estranha ver o dia ali, ver todos os dias ali, saber que eles existirão, mas não saber se você estará lá para ver tudo acontecer e, caso esteja, não saber como acontecerá. Mas imagine-se lá, acordando e vendo no relógio ao lado, estampado, 24/8/2020. Você, como bom conhecedor de história, há de se lembrar que é dia de celebrar a morte do mais importante presidente do Brasil (se nenhum outro à altura aparecer até lá... acho difícil).

Mas e daí? Você se levanta e toma café? Você beija sua mulher e vai trabalhar? Você está entrevado numa cama sem poder andar? Você está rico? Você está pobre? O dia está chuvoso ou o tempo está aberto? As pessoas falam com você? Você está em que cidade? Seus amigos de hoje ainda são seus amigos? Muitos de seus parentes já são falecidos?

Dúvida que instiga, dúvida que fascina, dúvida que angustia. Esses dias estava observando o dia 16 de julho de 2049, o dia em que, com a graça das graças, completarei meu sexagésimo aniversário. Já serei eu vovô nesse dia? Já serei pai? Serei alguma coisa na vida? Terei motivos para ter orgulho? E para ter satisfação? Já terei vivido o triplo de tempo que já vivi... por que experiências terei passado? Garanto que muitas agradáveis, e muitas desagradáveis. Quais?
O que me espera para que eu chegue até lá?

Não aguento mais apertar o botão do ponto de interrogação. Aliás, fazer isso é tão fastidioso quanto povoar a cabeça com essas suposições sobre o futuro. Também não adianta planejar em minúcias algo que depende de tantas variáveis que me fogem ao controle. E... veja bem... futuro para ser futuro tem que surpreender. Mas uma surpresa que só pode ser percebida quando nos lembramos dele já enquanto passado. Algo do tipo:
"Caraca, jamais pude imaginar que tudo isso fosse acontecer, e ainda mais dessa forma!"

Encerro, e peço que não me apedrejem, com o maior dos clichês, embora o mais verdadeiro, desde que interpretado convenientemente.

carpe diem.
(amanhã vou à praia)

sexta-feira, 3 de agosto de 2007

PET SHOP BOY

- Olha, mãe, que bonitinho.
- É minha filha, veja que fofinho.

O menino estava sentado na calçada, à penumbra das luzes das ruas e das vitrines. Seu olhar era distante e sua fisionomia era abatida.

- Mãe, porque ele está sozinho?
- Porque ele vai ser vendido, oras.

O menino não tinha pais. Não os conhecera. Vivia sozinho. Não estava acostumado a carinho, nem a atenção. Era só mais um infeliz, como muitos, tentando ser indiferente à própria vida e à própria realidade, pouco lhe importando se o destino lhe seria favorável ou excludente.

- Mas ele não sente saudades dos pais?
- Mas ele é bicho, Carolina!

O menino também não sentia saudades dos pais. Como poderia tê-las, se nem os conhecera?
Se ele era bicho, talvez Manuel Bandeira dissesse que sim.

- Porque ele está tremendo de frio?
- Porque deve estar frio lá dentro.

No frio da rua, o menino também tremia. Não só de frio, mas de fome e de desespero. Não tinha agasalho, não tinha atenção, não tinha escola, não tinha dignidade, não tinha alguém que com ele se preocupasse, não tinha teto, não tinha aquele edredom para noites geladas, nem a sopa quente e nutritiva que vovó faz.

- Vamos comprar, mãe?
- Tá maluca, Carol? Não tem como levar não, deixa que outra pessoa compra e cuida.
- Ahhhhhhh... por favor, por favor!
- Não. Agora vamos embora.

E foram-se embora sem notar que ao lado da vitrine do pet-shop, onde ali estava um exemplar de fofura vendido por não menos que um salário mínimo, havia um menino. Um menino sem fofura, um menino que nem salário mínimo valia, mas que também estava sozinho, não tinha pais e tremia de frio.

Por ser menino, por estar no escuro ou por ser só mais um entre muitos meninos desse Brasil, passou despercebido.
Talvez se fosse cachorro, numa vitrine, iluminado e em destaque, alguém lhe desse atenção.

Invejando uma vida de cão, o menino deitou-se no chão, encolheu-se de frio e fechou os olhos, desejoso de que na próxima encarnação nascesse cachorro.

quinta-feira, 2 de agosto de 2007

SÓ FALTOU A SUÁSTICA.

(rapidíssima)

Não sei se vocês acham humilhação entrar nessa loja popular, mas eu vou numa boa. E compro. No entanto, eles sempre estão lançando umas camisetas cujas estampas me deixam irritados demais. Em geral, são temas políticos que poucas pessoas conhecem e acabam usando a camisa sem ter a mínima idéia do que seja. Há um tempo atrás, eles lançaram uma camisa onde havia escrito CCCP. Para quem ainda não sabe, CCCP era a abreviação, em russo, de URSS (União das Repúblicas Socialistas Soviéticas). Quem sabia disso? Garanto que poucos. Quem conhece a história da URSS? Quem tem uma mínima idéia do que foi a experiência soviética? Quem sabe o que é socialismo, comunismo, Marx, Lenin, Stalin,...? Quem aceitaria desfilar conscientemente com o nome de uma das potências da Guerra Fria? Eu lá sei.

Mas isso não é nada. Ontem a Renner me reservou uma surpresa especialmente desagradável. Há agora uma linha de camisetas com temas alusivos à Alemanha, não sei se é coisa desse ano ou se é sobra de estoque do ano passado, quando houve a Copa em terras germânicas. Estava lá passeando pela loja, quando vejo uma Cruz de Ferro estampada, com uma águia atrás. Para quem não sabe, a cruz é um dos símbolos da Wehrmacht, o exército nazista alemão responsável por uma série de atrocidades notórias. A águia não estava no formato nem na posição utilizados nos tempos nazistas, mas perceptivelmente era uma águia. Em volta da imagem, a inscrição "STARKER MANN", que quer dizer homem forte. Uma alusão ao Reichsführer - "guia do império" -, título ao qual Adolf Hitler atendia?
Mais a frente, outra camisa da mesma série. Dessa vez, só havia a Cruz de Ferro, com as inscrições circundantes: "Blue Steel - Revolutionary Culture".
Sinceramente, acho que só não estamparam a suástica porque é crime ostentá-la.